Think pink: é a Maison Revolta!

26.11.2013

O estilista Rogério Vasques nasceu em Belém do Pará em 1979, terminou os estudos em SP com mestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC e decidiu estudar moda. Começou tudo de novo em Paris em 2003 (“que pra mim sempre foi a capital da moda”), aperfeiçoou o francês e entrou no L’Institut Français de la Mode. Fez um estágio de assistente de produção na marca própria de Karl Lagerfeld e quando terminou o curso na L’IFM acabou sendo contratado pra trabalhar na parte de estilo. Voltou em fevereiro de 2014 pro Brasil, depois de muita experiência, pra abrir a Maison Revolta, nova marca que foca no couro dublado, e que inaugura seu e-commerce na quarta-feira, 27/11.

A Maison Revolta tem uma roupa atemporal, aclimática, que vai da manhã até à noite. No seu avesso, que por sinal é caprichadíssimo, ela sempre traz um vivo pink como marca registrada. Mas é melhor deixar o Rogério explicar com suas próprias palavras! Confira!

Quanto tempo você trabalhou com o Karl Lagerfeld?
Trabalhei 5 anos na marca própria dele no estúdio de criação. Fazíamos também frilas pra Fendi, por exemplo, umas coisas pra Chanel. Saí de lá há uns dois, três anos, e fui pra Balenciaga onde fiquei por duas coleções, até a última do Ghesquière. Tinha vontade de trabalhar com ele, especificamente, e não sabia quem vinha depois que ele saiu. E ao mesmo tempo já estava a fim de voltar pro Brasil.

Mas você já tinha um plano de ter uma marca própria?
Sim, essa história com a moda sempre foi muito forte. Minha mãe é professora mas sempre costurou muito bem. Tenho lembranças de criança no pé da máquina de costura. Vivia desenhando croqui, ficava encantado. Mas na hora de fazer faculdade, não pensei nisso. Sabia que gostava de design, dessa história da criação, mas fui pra área da comunicação. E não tinha como fugir da moda… As coisas foram acontecendo, Paris e tal, foi tudo se configurando. E já sabia que era legal aprender o máximo que eu pudesse pra trazer isso pro Brasil com uma marca própria.

Por que você escolheu o couro como material principal da Revolta?
Sempre tive uma coisa forte com o couro. Não sei porquê, mas desde pequeno sempre gostei de pegar, do toque. Inclusive no Karl Lagerfeld trabalhei com o material. E se existe alguma maison que tem essa procura e pesquisa incessante de matéria-prima, é a Balenciaga. Passam semanas só pra desenvolver um tecido, um couro. Tem uma oficina que fornecia coisas pra Marc Jacobs e Louis Vuitton, e é de um amigo – começamos a fazer uns testes lá enquanto eu estava na Balenciaga, Ghesquière pressionava bastante pra buscarmos o máximo da criação e desenvolvimento. Então, à parte, comecei a afinar o couro, fazer dublagens… Isso foi o início da técnica que desenvolvemos pra Revolta, imaginando como eu poderia trabalhar o couro no Brasil. O país é o 3º maior produtor de couro no mundo. Pra mim era muito legítimo vir pra cá e trazer isso, mas também era quebrar todos os paradigmas: quando se pensa no material aqui já se imagina aquela jaqueta de couro pesada, invernal.

E você queria usar o couro brasileiro, mesmo.
Em fevereiro desse ano comecei a voltar pra cá e rodar um pouco o país, pra realmente conhecer essa história do couro do Brasil de perto, os curtumes. Nessas indas e vindas descobri o potencial incrível do Nordeste. São curtumes que exportam, com uma qualidade de trabalho ótima. E a legislação brasileira é muito bacana em relação a isso, eles ficam em cima.

Engraçado, o comum é pensar o contrário, que não existe uma legislação tão pesada por aqui.
E pelo contrário, tem inclusive todo um processo de tratamento [ecológico]. No curtume que a gente trabalha, a água que faz todo o processo químico e que seria o grande problema sai tão limpa que termina numa hortinha! Claro, estou falando dos curtumes que eu trabalho, que tenho conhecimento. Mas escutei que os que não são OK nesse quesito foram pro Paraguai. E achei muito legal, sobretudo, esse movimento que acontece no Nordeste, essa cadeia de trabalho que gera renda. Os curtumes ficam em cidadezinhas, tem um que fica mais próximo de Fortaleza mas a maioria é no interior.

E essa questão de dublagem do couro?
Os curtumes normalmente te dão um mínimo de espessura, que a gente chama de linhas. Nunca te entregam menos de 7 linhas, porque o couro vai rasgar e quem vai ser responsável é o curtume. Aí teve todo o meu trabalho de convencê-los a entregar o couro bem fino, explicar, porque minha ideia sempre foi afiná-lo com outra matéria-prima e criar outra história, com inclusive uma outra queda do material. Então tinha a possibilidade da dublagem, mas quando a gente fez os testes nessa oficina da Louis Vuitton ele descolava, era uma confusão. Aí entrei na internet, liguei pros amigos procurando informação. E cheguei numa empresa alemã que fornecia máquina pra dublar couro no banco de carro. Nas conversas, descobri também que o Brasil tinha acabado de comprar essa máquina, e ela estava no Sul, sete horas de ônibus pra chegar na cidadezinha. E então o circo estava armado, conseguiríamos usar o couro em um país tropical como o nosso quebrando esse paradigma. O sistema de dublagem que a gente desenvolveu empurra o calor pra fora. Guarda uma boa temperatura dentro mas não vai abafar, te fazer suar.

E como é o processo? O couro sai do Nordeste, vai pro Sul dublar…
Essa dublagem é com uma “teia de aranha”, que a gente importa da Europa, mas a máquina é a daqui. E a produção da roupa em si é toda em SP. Queria trazer o que aprendi lá fora: Karl sempre pegava o desenho, olhava a prova e dizia “Foi assim que eu imaginei”. O que aprendi é que tem o desenho, o desenho passa pra modelista, ela faz em tela de algodão, 1ª prova. Houve aprovação? Faz modificação? 2ª etapa, passa aquilo pro papel, cortamos o tecido… 2ª prova já é o primeiro protótipo. Validou ou volta pra segunda etapa? Todo esse processo pra mim é muito importante. Ainda não me vi chegando numa fábrica, dando o desenho e esperando o protótipo chegar. Fiquei no eixo Rio-SP também por precisar dessa modelista. Encontrei uma no Rio. O que tenho reparado é que, por causa desse processo de provas, a roupa da Revolta passa no corpo de várias mulheres. Realmente funciona, cai direito. Como a gente está no e-commerce, isso é fundamental.

O nome Revolta tem a ver com a sua volta?
Sim, mas também com a coisa de quebrar paradigmas, pensar diferente. Por exemplo: vamos começar pelo online, fazendo eventos em cada cidade levando a coleção – tem uma amiga que diz que vou sair em turnê! (Risos) Mas pra mim é superimportante encontrar essa cliente, passei 11 anos fora, preciso ter o contato, né? E na minha cabeça não adianta a marca vender em multimarca do Rio e de SP se o Brasil é tão grande, cada estado tem a sua história. Não dá pra fechar no eixo Rio-SP, vejo essa mulher brasileira como um todo, e com uma pegada internacional também, super à frente.

E a coleção é só couro dublado?
Não: tem malha, jérsei. São inclusive completamente diferentes – pra começar o couro é uma matéria viva! Não podemos deixar fechado no saco plástico porque ele respira. Mas toda essa outra parte da coleção tem origem vegetal, porque tenho horror a poliéster! (Risos) E nesse sistema de dublagem de não segurar o calor, se usássemos poliéster não ia dar certo, ia segurar e todo o trabalho iria por água abaixo.

A coleção está de que tamanho?
Não é enorme, não quero entrar na indústria da quantidade e do desespero. No alto-verão estamos com 19 referências sem as cores. Quero ir devagar, pela qualidade. Tem outro cuidado que a gente tem de, se der uma loucura, a mulher pode sair com a roupa do avesso de tão bom que ele é! Uma amiga nossa que trabalha com moda faz 30 anos e está ajudando a gente aqui achou que o lado certo de uma peça era o avesso e colocou a etiqueta no lugar errado! (Risos)

Por que começar na internet?
No ano que vem, a previsão é o que o Brasil esteja em 1º na lista dos países que mais compram roupa pela internet! Vai passar os eletrodomésticos. Mas o nosso site não é apenas um e-commerce. Também tem uma parte de lifestyle. Não quero que a marca seja apenas um nome, e a internet é o melhor canal pra isso. Karl é um contador de histórias absurdo: a maison Chanel é o que é pelo produto, mas também pelas histórias. Uma vez ele pegou todo o pessoal, da Chanel, da Fendi e da Karl, e fez um vídeo preto e branco paralelo a coleção Paris-Moscou [da alta-costura Métiers d’Art]. Transformou um teatro num cabaré dos anos 30, cada um era um personagem…

Você participa desse filme?!
Sim! Sou um dos que dançam. Como sou brasileiro, sobrou pra mim pra dançar, né? (Risos) Ele me contou em NY: “Rogério, vem cá! Seu papel está ótimo, você vai ser o dançarino!” E aí lá vai eu, na volta pra Paris, fazer curso de dança… E você entra no site da Chanel e tem milhões de vídeos. Mas voltando: também quero que a roupa da Revolta fique no nosso universo, por isso o e-commerce. Não gosto da ideia de uma multimarcas e a roupa ali no meio entre várias. E claro, ter a loja própria é um plano.

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