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A moda brasileira, por Oskar Metsavaht

16.11.2010

“Recebi o convite da [revista] Vizoo para escrever livremente sobre a moda brasileira. Por acaso estou em Nova York e passei esta semana na minha loja, no Soho, observando os clientes da Osklen. Sempre gostei de fazer isso, de ver o que seduz em minhas coleções. Percebo o estilo de cada pessoa que entra na loja e, muitas vezes, posso até apostar diante de que peças ela vai parar. Depois de ver a coleção, é normal que procurem pelo catálogo para tentar entender que marca é esta, de onde vem, quem é o estilista. Pois na loja de NY tem bermuda de surf, vestido de seda, tênis, sapato alto, jaqueta de couro, sobretudo de lã, Sandálias Ipanema, cashmere legítimo, etc. Esta mistura toda confunde qualquer pessoa. Uma marca brasileira, de um estilista que é médico, hetero, snowboarder, que mora em Ipanema, e assim por diante. Mas voltando a NY, além de ficar na Osklen observando, faço o ritual de sempre: visito as exposições nas galerias de Chelsea, os museus de arte moderna, assisto a uma peca na Broadway e vejo as outras marcas.

Não sei se é só comigo ou se é porque tenho viajado muito, mas tenho achado a moda muito parecida. Não só no Brasil como em todos os lugares. Há duas semanas eu estava em Tokyo por 10 dias, há um mês em Bali e em Dubai, nos Emirados Árabes. Pensando melhor, nestes últimos 12 meses, estive em Miami, Fiji, Paris, Milão, Roma, Aspen, NY, São Paulo, Los Angeles e Londres, além do Rio. Imagina só o que vi de moda, arte, bares, surf e snow. E aos meus olhos tudo é moda: o que as marcas apresentam nas lojas e nas revistas, e o que estas pessoas das mais diferentes culturas vestem, na praia, na neve, nas ruas e nas festas. Hoje, andando em algumas lojas aqui em NY, nada realmente me seduziu. Pensei: será que estou sobrecarregado de informação de moda? Ou está tudo, mesmo, muito parecido? Existem boas exceções, claro. Alguns designers mantêm seus clássicos com estilos inconfundíveis. E com pequenos detalhes fazem suas próprias releituras do que é a vanguarda. E outros poucos novos designers realmente mostram algo de novo.

ReproduçãoNa praia, foto de Oskar Metsavaht

Mas a moda está muito chata! Sem graça, enjoada. Acho que foram estes últimos 10 anos, de novo milênio. Eu nunca havia visto tantas propostas, de tantos lados. Embalados por uma onda de brasilidade, a cada ano existem mais e mais festivais de cinema, semanas de moda, prêmios de design, feiras de arte que lançam novos nomes, novos talentos. Como se fôssemos ter revelados, de uma hora para a outra, um monte de Fellini, Coco Chanel, Oscar Niemeyer, etc. A impressão é de que podemos estar perdendo verdadeiros talentos que foram esquecidos porque sempre tem que haver um novo, de qualquer maneira.

No Brasil já estamos nos achando os “reis da cocada”. Temos certeza de que o mundo quer a “nossa moda”. De que somos os mais criativos, os mais descolados. Mas não é por aí, não. O que está na “moda” mesmo é o nosso modo de viver. Somos felizes, saudáveis, sensuais, despojados e abertos. Somos mesmo. Não os mais bonitos, longe disto. E muito menos os mais bem vestidos. Acho até que, se houvesse um índice e classificação, estaríamos entre os últimos países em elegância! Somos básicos e caretas. Talvez pelo clima, pela falta de poder aquisitivo ou pela cultura de criticar e ao mesmo tempo dar atenção à critica. O ritual de vestir-se, para nós, não tem significado. O brasileiro ainda escolhe a marca antes de escolher o design da roupa que vai vestir. Já viajo há anos para algumas culturas diferentes, onde o vestir-se tem uma importância pelo seu significado. Como ler, apreciar a arte, as línguas, a música. Ainda temos muito que aprender sobre moda. Tanto para vestir-se quanto para criar. Somos uma cultura nova, jovem. Gosto de dizer que somos primitivos ainda. E que neste primitivismo é que está o nosso charme. Quando vou ao Japão vejo o quanto, em moda, eles são mais evoluídos que os europeus E, na mesma proporção, os europeus são mais evoluídos do que nós, brasileiros. Mas isto é óbvio, a cultura deles é milenar, a européia, secular. E a nossa cultura de moda tem apenas algumas décadas.

Exagero aqui um pouco, mas é para podermos ter uma noção do que temos pela frente: uma oportunidade. Temos do nosso lado um frescor em criatividade, e estamos emergindo num tempo em que a tecnologia nos permite ser observados no mundo todo, sem os filtros de editorias de revistas estrangeiras. E temos a chance de aprender, em tempo, sobre o que existe de moda pelo mundo todo. E, assim, de criar uma verdadeira identidade. Com design original, llinguagem estética universal e qualidade internacional, além de consciência socioambiental de verdade. Sem perdermos o nosso maior conteúdo: o Brazilian Soul.”

Publicado na edição número 68 da revista Vizoo, em novembro de 2010.

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