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Diane vira joia

15.10.2009

Diane Von Furstenberg tem uma personalidade tão forte que chega a dar medo. Com uma simples blusa-envelope, versão reduzida de seu antológico vestido-envelope, ela se impõe imediatamente quando entra na sala de almoço de seu refúgio no último andar do DVF Studio, um belo galpão no meatpacking district, em Nova York, onde ela concentra loja, espaço cultural, show-room, ateliê e um apartamento privado. A decoração combina peças modernas, como seu antológico retrato feito pelo amigo Andy Warhol na cozinha de sua casa, com peças africanas, indianas, tibetanas, enfim, lembranças de suas muitas viagens. E sua fisionomia valoriza seus traços fortes e expressivos, assim como o corpão com tudo em cima e um vigor raro para uma mulher de 58 anos.

Já passa de uma da tarde e ela pede (na verdade, determina) que sentemos imediatamente para o almoço. A refeição mais que frugal (salada verde, couve de bruxelas, aspargos e franguinho assado) já explica metade da boa forma de Diane – disciplina alimentar total. Entre uma asinha e outra, que ela saboreia com prazer e com as mãos, ela conta que o segredo de tudo está na meditação, que pratica todos os dias sem exceção. Talvez seja esta força espiritual que torne Diane tão naturalmente imperativa. Sem dúvida, trata-se de uma mulher que vai fundo na essência das coisas – materiais, sentimentais e espirituais.

ReproduçãoDiane von FurstenbergDiane von Furstenberg

Na noite anterior, sua primeira coleção de joias havia sido lançada na loja da H. Stern da Quinta Avenida. Ela estava exultante. Há vinte anos esperava por isso. “Conheci o sr. Hans Stern no Rio e desde então tento convencê-lo da minha capacidade para criar as mais lindas joias!”, diz. Foram muitos encontros e negativas ao longo desse período até que finalmente Diane “seduziu” Roberto, filho de Hans e diretor criativo da marca. “Sempre fui uma grande colecionadora de joias e amei as pedras preciosas da H. Stern desde o primeiro momento.”

Como a própria Diane, suas jóias também são fortes. Oscilam entre a limpeza das linhas, a beleza da pedra bruta, o romantismo das flores e corações, a superstição e/ou espiritualidade de palavras de proteção. Tudo para satisfazer o instinto feminino de se enfeitar, para si mesma e para seu homem. Suas peças preferidas são as grandes. Grandes, não. Bold. Ela aprendeu muito com Roberto e uma das lições mais marcantes foi esta: ninguém quer uma jóia pequena, por isso as peças vêm em três tamanhos: clássico, grande e bold.

Orgulhosa, dá um soco no ar, à la Mulher Maravilha, com um modelo da série Power Ring de geodo bruto acinzentado: “É uma verdadeira arma. De proteção e sedução”. E fala baixinho para o próprio Roberto Stern, que nos acompanha, não ouvir: “É uma das peças que comprei pra mim. Em vez de ganhar dinheiro com as jóias, vou acabar é gastando mais”.

Não que Diane tenha alguma dificuldade financeira. Pelo contrário. Vive em iates e jatinhos particulares e circula pelo melhor de Hollywood ou da Casa Branca. Sua vida, ela gosta de dizer, começou onde os contos de fada terminam: casou-se com um príncipe. O detalhe é que esta belga é filha de judeus (sua mãe foi prisioneira de Auschwitz) e Egon von Furstenberg era de origem alemã. Outro detalhe: o casamento só aconteceu porque ela estava grávida. E Diane só conseguiu quebrar a resistência da família dele quando, já separada, faturou US$ 1 bilhão com seu vestido-envelope (popularizado no Brasil com a versão mais conhecida como o vestido Vigotex).

Isso foi nos anos 70, quando ela e Egon se mudaram para Nova York e badalavam muito na noite do Studio 54 com amigos como Saint Laurent e Andy Warhol. Mas de dia ela trabalhava criando sua própria grife. O sucesso lhe rendeu capa do Wall Street Journal e da revista Newsweek, que a chamou de “a mulher mais influente da moda desde Chanel”. Depois de muitos romances (Diane chegou a largar tudo para viver com um brasileiro em Bali), uma falência (sua grife chegou a sumir completamente do mercado), vários livros (entre eles o autobiográfico “Diane: A Signature Life“) e um câncer, ela refez sua marca. E em 2001 resolveu se casar com o caso mais longo da sua vida, o magnata ziliardário Barry Diller, hoje ligado à internet.

Suas joias traduzem um pouco desses grandes momentos de sua vida. Ela vê o coração como um ex-voto e o transforma numa bolsa de ouro que leva dois meses para ser feita e US$ 30 mil para ser comprada. Uma pulseira antiga de sua coleção inspirou a linha Sutra (do sânscrito, fio ou alinhavo), onde elos bold (de ouro, pedras preciosas ou diamantes) se unem invocando palavras como amor, criatividade, harmonia, paz, abundância, conhecimento e integridade. A simbologia acompanha seu design: vai de uma chave (que para ela abre portas) à folha de gingko biloba (longevidade).

Para ela, jóias são sinônimo de adorno, investimento e talismã. “E com certeza as minhas causam impacto. São barulhentas e conferem mais personalidade a quem as usa”. Seu entusiasmo é tão grande que só encontra similar quando ela fala do revival de seu vestido-envelope. De linhas minimalistas e estampas selvagens (onça, zebra e cobra viraram clássicos), o vestido virou curinga do guarda-roupa das mulheres liberadas, pós-passeata de queima de sutiãs, quando surgiu no início dos anos 70 e agora, desde que voltou como ícone fashion no final dos anos 90, conquistou nomes como Gwyneth Paltrow, Sarah Jessica Parker e Nicole Kidman, além de sua nora, a não menos rica e famosa Alexandra, a mais nova das Miller Sisters, que hoje trabalha com a sogra.

Lilian Pacce, para a revista “Vogue” Brasil, fevereiro de 2005

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