Um fenômeno de mídia chamado “Visionaire”

10.08.1998

Teoricamente uma revista de tiragem baixa, periodicidade escassa, custo altíssimo e nenhuma publicidade está fadada ao fracasso. Exceto por um fenômeno de mídia chamado “Visionaire”. Surgida em 1991, a revista tem sede em NY, circula com entusiasmo pelo fashion world e tem cara de Paris: cada edição é única no formato e no conteúdo. Cada exemplar recebe acabamento manual como os modelos de alta-costura, o que lhe rendeu a fama de “a alta-costura das revistas” no mercado internacional. Além disso, cada edição coincide com uma estação do ano, seguindo o calendário da moda que trabalha com as coleções de primavera, verão, outono e inverno.

Mas Visionaire não é uma revista de moda, embora seja a revista da moda. “É uma galeria em forma de revista, em forma de livro de arte, é um workshop de criação onde o mundo das artes visuais tem liberdade total de expressão, cada artista pode propor o que quiser”, diz Stephen Gan, 32 anos, fundador e sócio da “Visionaire”, em entrevista exclusiva ao Estado. Ele esteve no Brasil acertando os últimos detalhes do catálogo da Zoomp, que será lançado no início de setembro. Gan é autor do projeto gráfico do catálogo primavera-verão 98 que, ao abrir-se, se transforma em um Z que dá suporte às imagens feitas pelo top fotógrafo Mario Testino no Rio de Janeiro e em Paris.

Filipino, filho de chineses, Gan migrou para os Estados Unidos aos 18 anos. Teve uma breve passagem pela Parsons School e logo virou editor de moda da revista masculina “Details”. Aos 24 anos e com US$ 10 mil no bolso, ele e os amigos Cecilia Dean (modelo) e James Kaliardos (maquiador) se uniram para realizar o sonho de muitos profissionais que trabalham com moda: lançar um veículo livre, independente e com plena liberdade de criação. “Percebemos que nossos amigos tinham expectativas frustradas com as revistas e clientes para quem trabalhavam, sem poder publicar o que eles realmente preferiam”, conta Gan.

O primeiro número foi uma compilação de imagens preferidas: “Sob o mesmo formato, colocamos uma aquarela ao lado de uma foto de moda, um desenho de nu ao lado de uma colagem.” A tiragem de apenas mil exemplares foi uma imposição da pouca verba de que dispunham (US$ 10 mil), mas o reduzido número de exemplares acabou se transformando em mais um atrativo num meio que preza a exclusividade e a originalidade. “Pode parecer arrogante, mas as pessoas adoram o fato de terem um objeto de tão poucas cópias no mundo”, declara Gan.

Hoje, algumas edições chegam a 5 mil exemplares, como é o caso da edição comemorativa do 25º número, que pode ser encontrada nas livrarias Toc na Cuca (tel. 852-2030) por R$ 300. Em formato de álbum de LP (um relíquia desta era de CDs), ela traz os “Greatest Hits” de assíduos colaboradores. Onde mais você poderia ver Karl Lagerfeld fotografando Yohji Yamamoto? Ou David Bowie entrevistando a vanguarda da arte britânica como Beth B., Gavin Turk e Tony Oursler? E mais: um CD com a new new-age do DJ japonês Towa Tei, as ilustrações de Rubem Toledo para o figurino de Twyla Tharp, as “new visions” de novos nomes como Bless, Veronique Branquinho e Olivier Theyskens, e imagens deslumbrantes de Mario Sorrenti (para Junya Watanabe), Luis Sanchis (para Hussein Chalayan) e John Akerhurst (para Christian Lacroix). A festa de lançamento ocorreu na Colette, a loja mais cool de Paris, que organizou um exposição com imagens marcantes publicadas pela Visionaire.

Fantasia – Embora já estivesse devidamente estabelecida no mercado, a “Visionaire” deu uma virada há dois anos, quando lançou sua primeira edição com patrocínio. A revista veio dentro de uma pasta confeccionada especialmente pela Louis Vuitton, que virou hit absoluto na “fashion net”. Desta experiência, surgiram outras parcerias como as edições Beauty (patrocinada pela Prescriptives) e Diamond (patrocinada pela H.Stern).

Outras vezes, Gan passou a convidar um editor especial. A estilista japonesa Rei Kawakubo (da grife Comme des Garçons) foi a primeira, depois vieram Karl Lagerfeld, Mario Testino (que, ao criar um diário dos anos 90 sob o título Chic, substituiu algumas páginas por tecidos exclusivos e juntou um guardanapo com um beijo de Paloma Picasso a um pedaço do vestido usado por Madonna e ao faxsímile de um bilhete de Catherine Deneuve a Saint-Laurent) e Tom Ford, da Gucci. “Ford queria algo que remetesse ao futuro e surgiu o tema Light que nos levou a brincar de engenheiro eletrônico para conseguirmos executar uma revista que se acendesse ao ser aberta”, diz Gan. Light, uma revista em forma de caixa de luz de acrílico preto, foi a edição mais cara: US$ 450 nos EUA, mais US$ 85 só de postagem para algumas cidades do mundo. “O que mais nos estimula é o desafio de inventar algo excitante que ainda não fizemos”, diz.

Assim, a “Visionaire” se mantém única no mercado (apesar de algumas tentativas de cópia surgirem aqui e ali). “Somos uma revista de moda que não publica necessariamente roupas ou tendências, mas sim um álbum de imagens que inspiram moda”, define. A proposta ambiciosa gera sempre grande expectativa a cada edição, tanto pelo tema quanto pelas festas memoráveis que acompanham seu lançamento. “Estamos ficando mais famosos pelas festas”, brinca. Então, aguce sua expectativa. A revista que realiza e surpreende até as fantasias de quem tem poucas fantasias com a moda vai mexer com todas as fantasias. Aguarde. Em outubro.

Lilian Pacce para O Estado de S.Paulo

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