Robert Fraser e rock’n’roll em Swinging London

25.03.2015

No começo do século 20, Sergei Diaghilev criou os Ballets Russes. Ele não dançava, não era coreógrafo, não era compositor – mas sabia reunir os talentos mais extraordinários de sua época, como Picasso, Braque, Cocteau etc. Os Ballets Russes impactaram o mundo da dança e também moda, arte contemporânea, cinema, música…

Já nos anos 60, o galerista Robert Fraser teve um papel similar frequentando todos os maiores artistas de sua época – como por exemplo Rolling Stones, Marianne Faithfull ou Peter Blake. Com isso em mente, a galeria Pace London apresenta a mostra “A Strong Sweet Smell of Incense” em homenagem a Fraser. Curada pelo artista e amigo de Robert, Brian Clarke, a expô consegue recriar o espírito de uma época mítica: os Swinging London dos anos 60. Quem ficou interessado precisa correr: a exposição vai só até 1/04! E pra dar um gostinho, entrevistamos a diretora da Pace London, a paulista Elizabeth Esteve, pra saber um pouco mais sobre essa vida fora do comum!

Como o ex-aluno do Eton [o colégio tradicional britânico da nobreza e elite inglesa], Robert Fraser, virou o Groovy Bobby, amigos das maiores estrelas dos anos 60?
Com 18 anos, Fraser decidiu se mudar pra NY. Lá ele descobriu a cultura alternativa dos anos 60, com a revolução sexual, pessoas experimentando coisas novas… Fez muitas amizades com artistas americanos tais como Andy Warhol e Keith Haring. Toda essa cena artística emergente ainda não existia em Londres, então quando ele voltou de NY e decidiu abrir a galeria com o dinheiro do pai foi um verdadeiro sucesso. A sua 1ª exposição foi Jean Dubuffet. Não dá pra perceber agora porque parece muito diferente do que estamos acostumados, mas Dubuffet poderia ser considerado um artista de graffiti. Jean-Michel Basquiat, por exemplo, era totalmente obcecado com o trabalho dele. Ia todo dia na nossa galeria de NY e cada vez que o Arne Glimcher [fundador da Pace] tinha uma nova obra de Dubuffet chegando de Paris, ligava pedindo se podia dar uma olhada.

Como Fraser escolhia a programação da galeria?
Na verdade não existia um programa de curadoria como vemos hoje em dia, decidido com meses de antecedência. Era um laissez-faire total! Ele só queria mostrar o que estava acontecendo em um determinado momento. Naquela época, as galerias não eram tão focadas no business como hoje.

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Quais são os destaques da exposição?
É difícil dizer isso já que o destaque da exposição é ele mesmo, Robert Fraser. Clarke, o curador, quis recriar um retrato fiel reunindo muitas obras que passaram pela galeria dele. Quando você entra, a 1ª obra com a qual você dá de cara é a predileta de Fraser, “Camouflage République“, feita pelo francês Alain Jacquet em 1963. Ela representa o perigo da época com a palavra DANGER. Outros destaques são dois quadros de Francis Bacon e as duas obras de Keith Haring, o maior artista de graffiti dos anos 80, que Robert sempre apoiou ao longo de sua carreira. E temos uma parte com seus arquivos: obras de arte, cartas, fotos etc.

E vocês reproduziram o escritório dele, por quê?
O objetivo é criar um tipo de gabinete de curiosidades pra que os visitantes entendam melhor quem ele era. O humor era sempre presente em tudo e vemos cada vez mais cabinet de curiosités nas exposições: “Magnificent Obsessions: The artist as a Collector” no Barbican Centre, “Savage Beauty” sobre o estilista Alexander McQueen. Isso é uma tendência do momento! E você consegue entender a personalidade de alguém pelos livros que a pessoa tem na sua estante, as obras de artes que ela tem nas suas paredes. Também há algo de muito íntimo em olhar o escritório de alguém. O daqui foi inteiramente recriado a partir de uma foto dos anos 60, com a cadeira, lâmpada, os quadros no chão… É como se ele tivesse apenas saído pra fumar um cigarro há cinco minutos! Além disso, é uma oportunidade de mostrar algo além do “party boy” da turma dos Rolling Stones: o homem de negócios. É um aspecto da personalidade que a gente também vê no retrato feito por Jean-Michel Basquiat com páginas de sua agenda coladas na tela.

Como você acabou de lembrar, ele era íntimo dos Rolling Stones, dos Beatles etc. Por que ele era tão atraído pela cena musical daquela época?
Nos anos 60, os Beatles e os Rolling Stones estavam acontecendo. Foi Robert que apresentou Peter Blake pros Beatles [e ele acabou fazendo a capa do álbum “Sgt. Pepper”]. Era um tempo de grandes mudanças, a arte estava por toda parte, não só nos quadros mas no cinema, na moda etc. Ele juntava todas essas pessoas na galeria dele, da mesma maneira que a Gertrude Stein recebia a vanguarda do começo do século 20 na casa dela.

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Por que vocês escolheram esse titulo pra exposição?
“A Strong Sweet Smell of Incense” faz referência ao dia em que Robert estava na casa de Keith Richards nos anos 60 e aconteceu uma batida policial. Quando perguntaram sobre o cheiro, Mick Jagger respondeu: “Hey man, não é nada, it’s just a strong sweet smell of incense” (ou “é só um cheiro forte e doce de incenso”). A polícia os levou pra cadeia porque achou pílulas de heroína nos bolsos de Robert e de anfetamina nos de Mick. Fraser ficou na cadeia durante alguns meses. Na obra de Richard Hamilton, “Swingeing London 67“, podemos ver Jagger e Fraser com algemas dentro da viatura. Essas fotos são extremamente importantes pra cultura pop britânica, pois representam o momento em que a cena artística alternativa realmente veio pra ficar. Elas também refletem o quanto eles eram jovens, rebeldes, experimentando novas coisas. Causaram tanto escândalo na época que Fraser até teve a sua galeria fechada depois dela ter sido julgada indecente.

De onde veio a ideia de apresentar simultaneamente uma exposição com obras de Brian Clarke no 1º andar paralela a “A Strong Sweet Smell of Incense”?
Depois de sua viagem pra Índia, Robert reabriu sua galeria com uma exposição de Clarke, que é exatamente a que está no 1º piso hoje!

Carolina Cataldi Pedrosa, infohunter direto de Londres

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