O cangaço mais alegre e colorido, por Azol

20.05.2016

O sertão brasileiro e o cangaço apareceram em mais de um desfile no SPFW, como Lilly SartiHelo Rocha. Descobrimos, então, um artista que explora lindamente essa temática: Azol, nome artístico de Sérgio Oliveira, nascido em Natal (RN). Ele trabalha o cangaço com uma estética colorida e muito frescor. Aqui, ele conta pra gente como descobriu o cangaço e fala de sua arte. E, clicando na foto, você confere o trabalho dele!

Relembre o desfile de Helo Rocha, inspirado também no cangaço

Por que Azol como nome artístico?
AZOL é a junção das iniciais de meu sobrenome, Azevedo Oliveira. Achei o nome forte, com identidade e potencial.

Quando surgiu a paixão pelas artes plásticas?
O meu primeiro contato com as artes foi no ensino fundamental, lá pela 7ª ou 8ª série. Eu costumava desenhar na contracapa dos meus cadernos e fazia tirinhas cômicas usando meus colegas como personagens.

Quando deixou de ser hobby e passou a ser trabalho?
Há uns 5 anos, quando me desliguei da sociedade com uma produtora de áudio-visual. Além do cinema, também tenho diploma em artes gráficas e ilustração, e decidi me enveredar para este lado. Comecei a desenhar e pintar e, eventualmente, me rendi às redes sociais e comecei a postar. Meu trabalho teve uma aceitação muito grande e os clientes apareceram. Me empolguei, participei de ateliês de pintura e escultura e comecei a experimentar a colagem. A abertura do ateliê foi inevitável.

Como é ter o ateliê em casa? Muitas influências da família no trabalho?
Moro em casa, em uma área muito bonita de SP que é o Pacaembu. É uma situação extremamente confortável, segura, conveniente e inspiradora pra mim, especialmente porque SP é uma cidade muito complexa, com grande problema de mobilidade, trânsito caótico e segurança. Graças a Deus me considero um felizardo. A família me inspira porque existe muito amor, cumplicidade, admiração e respeito entre nós. São valores importantíssimos pra um indivíduo construir um sólido corpo de trabalho e uma vida de qualidade.

Como é seu processo criativo?
Sempre tive uma cabeça muito visual, daí a paixão pelo cinema. Com o passar dos anos, adquiri o hábito de procurar no cotidiano as fontes de inspiração, coisas que me estimulam a criar, como a natureza, os rostos, uma boa leitura, objetos, as máquinas, a cidade, uma conversa, enfim, tudo me inspira. Além do mais, estou sempre me atualizando com relação às exposições que acontecem na cidade e fora do país. Isso me oxigena. Tenho vários cadernos de desenho e, quando pinta algo na cabeça, pego logo um deles e começo a rabiscar. E pesquiso muito sobre o tema cangaço.

Como surgiu essa temática?
Fiz alguns estudos em arte abstrata e figurativa, mas não encontrei nelas uma identificação, algo que fizesse eu me apegar, sabe? O cangaço chegou em minha vida depois de um longuíssimo processo de auto-descoberta. Vivo há muitos anos fora da minha cidade e em todo lugar por onde passei adquiri um sentimento incômodo, uma espécie de falta de pertencimento do ponto de vista cultural. Me adaptava aos costumes e ao estilo de vida, mas me sentia um “outsider”. Através da análise, pude fazer uma auto-descoberta pra entender essa confusão e resgatei as minhas origens como num ritual místico e trouxe de volta a minha identidade. Comecei a entender que o lugar de onde vim estava longe fisicamente, mas muito perto espiritualmente e culturalmente. Foi nesse processo que me reencontrei com a poderosa cultura popular nordestina, o folclore, suas tradições e, quando me deparei com a iconografia do cangaço, “BUUMMM”! Foi uma explosão que me nocauteou. Encontrei o estudo que o pesquisador e historiador Frederico Pernambucano de Melo fez sobre a Estética do Cangaço, um trabalho rico e minucioso sobre o surgimento da linguagem visual do movimento e comecei a fazer experimentos. Foi um tiro certeiro!

Como você faz pra representar o cangaço?
O tema cangaço é por natureza muito triste, pois representa um período violentíssimo do nordeste brasileiro. Foi uma época de muita seca e o Brasil estava economicamente muito frágil, a pobreza imperava na região. A minha paleta de cores, por outro lado, é viva e muito colorida porque retrata o cangaço pela ótica da estética e não antropológica. Imagine que, nos anos 20 e 30, no sertão nordestino, o lugar era inóspito, árido e monocromático. Daí surge uma trupe de loucos criminosos fantasiados daquela maneira que conhecemos. Era um contraste, uma coisa bizarra, alegórica. A vestimenta do cangaceiro era uma “afetação estética”, como diria o Frederico Pernambucano. Então, a minha arte reflete essa ótica, afetação e contraste. Outro aspecto que eu queria mencionar é que Lampião sofria de um paradoxo. Ao mesmo tempo em que ele matava e degolava sem piedade seus oponentes, ele mantinha uma sensibilidade pra criar suas roupas e acessórios. Lampião também era estilista, desenhava e costurava as próprias roupas e obrigava seus seguidores a fazerem o mesmo. Eu também carrego esse paradoxo pra minha arte, ou seja, ela representa um tema triste de uma forma alegre e viva por intermédio da paleta de cores. Essas cores estão associadas à luminosidade do nordeste, à beleza da linguagem visual do cangaço e à nossa herança cultural.

Quais os materiais mais utilizados?
Utilizo tinta acrílica pras telas e e vez em quando uso bastões de pastel à óleo. Já pra colagem e esculturas, misturo muito, faço experimentos e lanço mão da técnica mista. Ultimamente, tenho feito esculturas com papelão, isopor, espuma, plástico, galhos, etc.

Como foi pra você expor em Natal? E fora do Brasil?
Foi fantástico! Foi a minha primeira exposição individual na cidade e num local lindíssimo, uma casa construída no início do século passado em estilo colonial que hoje funciona como um centro cultural da cidade. No exterior, participei de exposições coletivas em uma galeria em NY e outra em Paris, e de duas feiras internacionais: Artexpo New York e Artshopping Le Carrossel Du Louvre, em Paris. Valeu como experiência mas, atualmente, estou mais focado no mercado brasileiro. Existe muito a se explorar por aqui.

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