Erwin Blumenfeld pelos olhos de sua neta

28.10.2014

A exposiçãoBlumenfeld Studio: New York 1941 – 1960, com o trabalho do fotógrafo Erwin Blumenfeld, abre hoje às 19h30 para convidados no MAB-FAAP, em SP. A mostra conta com mais de 90 fotos, que tiveram seus cromos digitalizados e impressos em 2012 pelo museu francês Nicéphore Niépce, além de exemplares originais – todos da coleção da nora de Blumenfeld – de publicações que incluem seu trabalho.

A curadoria é de Danniel Rangel e Nadia Blumenfeld, neta do fotógrafo, que veio a SP pra abertura da expô. Blog LP conversou com ela pra saber, de perto, como era o processo de criação de seu avô, a relação dele com grandes musas (incluindo Audrey Hepburn e Marlene Dietrich) e as memórias de Nádia no Blumenfeld Studio – estúdio em NY onde ele realizou a maior parte de seu trabalho. Abaixo você confere a entrevista e na galeria, os trabalhos citados por Nadia!

Confira mais fotos da exposição – clica aqui!

Erwin Blumenfeld foi muito famoso por participar do processo completo da criação de suas imagens – do estúdio à revelação. Como era esse desenvolvimento?
Ele realizou a maioria dos seus trabalhos em seu estúdio de NY, que ficava próximo ao Central Park, já que ele não era um fotógrafo de locação aberta, apenas com raras exceções. Meu avô sempre gostou de ter o controle total da sessão e, dificilmente, seguia as ordens que recebia das revistas quando tinha que mostrar roupas. Reclamavam que ele não mostrava as peças o suficiente mas, na verdade, essa era a forma que ele achou de brincar e lidar com a moda, como na capa da “Vogue” americana de janeiro de 1951 em que a modelo vestia um look da Dior que mal aparecia. Ele precisava cuidar de cada detalhe nas fotos, mas seu foco maior ficava pra parte da revelação, principalmente quando ele começou a trabalhar com cor. No início quem fazia as revelações era a Kodak e frequentemente ele ficava insatisfeito com o resultado. A Kodak até fez máquinas especiais pra ele revelar as fotografias coloridas. A alteração de cor feita pelos diretores de arte das revistas era outro ponto que o deixava insatisfeito e, por isso, ao mesmo tempo que fazia as fotos em cor pras revistas, tinha o costume de clicar versões em P&B pra si mesmo – como fez com a famosa capa da “Vogue” de 1950, a “Doe Eye“, que é originalmente em P&B e foi colorida pela equipe da revista posteriormente.

Como era a relação de Blumenfeld com as modelos, atrizes e musas que fotografava?
Ele amava fotografar mulheres bonitas, independentemente de serem modelos ou famosas. Ele gostava de deixá-las à vontade em seu estúdio, falava em alemão com a Marlene Deitrich, em holandês com a Audrey Hepburn… Era ele quem escolhia as modelos e gostava de mulheres em geral, mas tinha um padrão estético que fugia da beleza clássica da época, de loiras com narizes perfeitos. Ele preferia as morenas com pescoços longos, como Dovima, Evelyn Tripp e Nancy Berg. Dizia que modelos com pouco pescoço eram difíceis de fotografar.

Ele trabalhou 15 anos na “Vogue” americana. Como foi essa passagem pela revista?
Blumenfeld começou trabalhando na “Vogue” francesa, mas assinou um contrato com a “Harper’s Bazaar” americana em 1939 pra cobrir a moda parisiense. Na França, foi pego pela guerra e escapou em 1941, continuando seu trabalho em NY pra “Harper’s Bazaar” com a direção criativa de Alexey Brodovitch. Alexander Liberman o convidou pra trabalhar na “Vogue” americana em 1943. Os dois tinham uma relação muito próxima e se deram muito bem por pelo menos 10 anos… Mas em 1955 ele deixou a revista. A “Vogue” era muito seletiva e, se eles gostavam de um fotógrafo, o “adotavam” até se interessarem pelo próximo. Na época, fotógrafos como Irvin Penn e Hiro estavam crescendo e Blumenfeld passou a se sentir substituído. Pelo que sei, a gota d’água foi quando meu avô fez uma sessão pra revista e pediram que ela fosse refeita por outro fotógrafo.

Ele tinha uma boa relação com os outros fotógrafos?
Ele era muito solitário como fotógrafo, mas tinha uma ótima relação com o Martin Munkácsi, da “Harper’s Bazaar” na época. Eles até dividiram um estúdio em NY, em 1941, antes de Blumenfeld comprar o seu próprio. Mas meu avô não gostava muito de Penn e não apreciava a fotografia do Richard Avedon – achava suas fotos muito pesadas e não acreditava que ele deixasse as mulheres bonitas.

Quando que ele começou a fazer vídeos?
Ele gostava muito de filmes, como os de Charlie Chaplin, dos Irmãos Max, entre vários outros. Não sei exatamente quando que a ideia surgiu, mas ele começou a fazê-los no fim dos anos 50. Em suas fotos, ele usava muito o ventilador pra criar movimento, como na capa da “Vogue” de maio de 1953, que virou vídeo posteriormente com as flores voando. Seus vídeos nunca fizeram sucesso comercial, mas as técnicas usadas dentro do estúdio eram muito parecidas com as usadas pra fazer fotos. Atualmente o Showstudio disponibiliza alguns de seus vídeos no site.

Você conviveu com ele?
Sim, nasci em NY e ia ao seu estúdio quando criança. Gostava de ver e mexer nas fotografias dentro da sala escura no processo de revelação. Lembro que ele fazia 20 versões de cada foto que tirava para compará-las e depois descartar aquelas que não eram perfeitas, até acertar na cor. Minha mãe era sua assistente, eles se conheceram pois ela era responsável pelo casting das modelos da “Vogue”. Após ela se casar com o meu pai [filho de Blumenfeld], ela não tinha tempo de ir até o estúdio com tanta frequência e acabou se tornando fotógrafa também. Lembro também que meu avô não tinha comentários muito positivos sobre a indústria da moda, mas era onde conseguia produzir um material de muita força, capaz de sustentá-lo financeiramente, diferente de quando morava na França e fazia retratos e fotos de beleza. Seu maior problema com a moda era o fato de existirem outras pessoas que controlavam seu trabalho, mesmo que ao lado dele.

Algumas fotos ainda possuem um ar contemporâneo. De onde você acha que vem essa força?
Olho para algumas fotos e penso que poderiam ter sido tiradas ontem. Acho que isso acontece pois ele inspirou muitos fotógrafos de gerações posteriores e, às vezes, acontece até de aparecerem fotos muito similares em publicações. Já vi várias vezes trabalhos semelhantes em revistas e sites à foto de Nancy Berg de 1956, por exemplo. Um dia desses, conheci um diretor de arte que me disse que quando seus fotógrafos estão precisando de inspiração, ele fala pra olharem o trabalho de meu avô. Acho isso muito positivo. A própria Chanel fez um vídeo com o fotógrafo Solve Sundsbo em 2012 usando a ideia da “Doe Eye“, uma homenagem ao Blumenfeld… Peter Lindbergh também fez algo muito parecido com a foto da “Vogue” em 1939 de Lisa Fonssagrives na Torre Eiffel. Mas está tudo certo, é lisonjeiro da parte deles que se sintam inspirados e desejem homenagear o meu avô.

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