SPFW Primavera-Verão 2001/02

03.07.2001

Todo tailleur Chanel tem um segredo escondido na bainha do casaco. É uma corrente, que garante ao modelo um caimento impecável. Partindo desse princípio, Alexandre Herchcovitch embutiu correntes em todos os seus modelos femininos, mas só que do lado de fora da roupa: da bainha dos vestidos amplos aos frisos intercalados nas listras de crepe georgete colorido. Seu desfile de primavera-verão 2001/02 foi o destaque do último dia de coleções femininas desta 11a. São Paulo Fashion Week, que terminou ontem na Fundação Bienal, no parque do Ibirapuera, com os lançamentos de moda praia.
A mulher de Herchcovitch vem com peruca grisalha, cobrindo levemente os olhos, com vestidos longos que parecem robes-de-chambre vaporosos. O recurso das correntes provoca nas roupas novos volumes: físicos (a roupa de amplas proporções acaba ficando próxima ao corpo) e também sonoros, já que as correntes fazem barulho conforme o corpo se movimenta. Mas o resultado é delicado. O desfile na passarela espelhada começa com uma série de modelos em preto com duas ou três flores de metal aplicadas, e sempre com a corrente em algum lugar. Ela faz a gola mole cair drapeada no top ou no decote do vestido verde-água, que deixa entrever as costas.
Herchcovitch alterna o uso das correntes com bandagens punk, mais explícitas nas calças (como a prata empapelada) e mais sutis em ombros e cinturas de tops de malha. As calças são sequinhas ou muito amplas. E as salopetes prometem ser hit de verão. A cartela de cores, igual à da coleção masculina, é toda intercambiável e se repete na estampa de flor. Herchcovitch faz mil composições com seu verde-água, amarelo-canário, magenta, uva e preto, inclusive nos sapatos de salto de madeira e ponta redonda.
Herchcovitch também é responsável pelo estilo da Zoomp, que fez o último desfile do dia numa passarela forrada com faixas de espuma colorida. Os sapatos de bico fino revisitam a boa e confortável alpargatas. Nos bastidores, eram objeto de desejo das modelos Lu Curtis, Mariana Weickert e Caroline Ribeiro, mas deram vexame na passarela com os saltos caindo pelo desfile. Uma pena, pois o modelo é realmente bacana.
Com um olhar bem peculiar, que às vezes capricha no prazer de ser cafona, a coleção traz o Havaí para cá. O surfista pega onda nos jeans aerografados, nos vestidinhos franzidos de crepe e no desenho do tricô. O bege-blush é o fio condutor e compõe tops-corset ou se mistura ao jeans claro, criando listras. Outro padrão de listras é a do jogo frente-verso com o próprio jeans. Renato Kherlakian, dono da Zoomp, me disse que estava reeditando a calça clochard (do francês, vagabundo, é aquele modelo bem largo que franze fazendo a cintura parecer uma couve-flor). Mas o que parecia temerário ficou jovem e moderno: trata-se de uma clochard de cintura e cavalo baixos, levemente franzida. Já as fuseaux em total look de lycra, com faixa drapeada no quadril, são de tremer…
Duas grifes estrearam nas coleções femininas: André Lima e Cavalera. A Cavalera também passa pelo Havaí, mas seu personagem principal é King Kong com a mulher-macaco Monga, do Playcenter. “Eles se apaixonaram e foram namorar lá”, conta Thais Losso, estilista da marca que pertence ao deputado estadual Turco Loco e ao músico Igor Cavalera, da banda Sepultura. A coleção é macaquice pura, com estampas de cenas do filme, de macacos lutando, no mar e no Elma Chimps da camiseta, em colorido ou preto-e-branco com efeito gliter ou siliconado. O desfile começa com um King Kong inflando na passarela e de sua boca saem os modelos, como a loira e linda Jéssica (Isabel Zachow).
Todo macaco quer banana e dá-lhe mais estampas, botons e uma divertida banana bag – sem contar o chaveiro, em tamanho natural. O streetwear da Cavalera é bem-humorado, colorido e confortável. No masculino, Thais pega elementos do surfe, como a amarração do calção, e transpõe para a alfaiataria. Assim como na Zoomp, o feminino passa por tules e frufrus das bailarinas usados com body listrado, minimoletons e sandália dourada com flor de tecido igual à do cabelo.

André Lima aproveita sua estréia na SPFW para deixar claro que é um estilista de excessos. A começar pelos convidados de sua platéia: covers do Kiss, de Michael Jackson e de Maria Bethânia – a melhor editora de moda do Brasil, segundo Lima. Ele que adora um vestido de cetim em viés adorna seus modelos com rendas, cintos-ciganos de medalhas de ouro ou cinto-espartilho de couro rendado, numa imagem de personalidade forte e exuberante que funde ciganas e espanholas. Mas o vestido não vem só: é usado com corsários de jeans (linha que ele está lançando) ou com pareô de seda florida. Bem lembrada a imagem de uma foto de Diana Vreeland dos anos 40 (ela sim um grande ícone da moda mundial), com chapéu e flor no cabelo.

FASHIONET

Nova Itália – O historiador e jornalista inglês Colin McDowell, autor de vários livros que são referência na moda, foi ontem para Paris, depois de assistir alguns desfiles da São Paulo Fashion Week. Mas ele volta para ver as coleções do BarraShopping, que acontece no Rio entre os dias 15 e 18, e só então fará seu artigo definitivo sobre moda brasileira para o jornal britânico “Sunday Times“. “A moda aqui é excitante e viva, assim como o Brasil, que é realmente um país jovem”, disse ao Estado. “A Itália demorou 15 anos para estabelecer a sua moda e fazer parte do calendário internacional. Nesse sentido, o Brasil deve ser a próxima Itália num prazo de dez anos talvez”.

Nova aposta – Mc Dowell, com toda razão, ficou indignado com os atrasos dos desfiles. “Em Paris a gente vê 15 desfiles num só dia”. Mas foi embora bem impressionado com pelo menos quatro estilistas: Alexandre Herchcovitch, Lino Villaventura, Fause Haten e Walter Rodrigues. Ele diz que aposta em um estilista do Brasil, mas isso ele só vai revelar quando fizer o artigo para o Sunday Times em agosto.

Novo evento – Muita gente está se mexendo para que a previsão de Colin McDowell, de que “em dez anos o Brasil seja um grande pólo de moda”, realmente se concretize. Paulo Borges, organizador da SPFW, e Beto Lago, do Mercado Mundo Mix, idealizaram o Hot Spot Fashion Mix, que pretende dar suporte à novas gerações de profissionais ligados à moda, como estilistas, diretores de arte, fotógrafos, modelos, maquiadores, cabeleireiros e DJs. O evento será em agosto e foram selecionados nomes de todo o País. Com patrocínio do Amni Rhodia, o projeto pretende acompanhar esses artistas em todas as etapas do processo, durante dois ou três anos.

Novo talento – Um dos talentos do Hot Spot é o gaúcho Marcelo Bohrer, estlista da marca Visgo. Ele é o careca lindo que circulou pela SPFW com óculos-máscaras que dão um de extra-terrestre. Seu discurso é “cyber organic” e as roupas, futuristas e coloridas, saídas de um desenho japonês. Você pode matar sua curiosidade entrando no site do rapaz: www.visgo.com.br

Tudo novo – Depois de seis campanhas com o fotógrafo peruano Mario Testino, a Zoomp parte para um novo conceito. Selecionou uma equipe de novíssimos talentos da moda para criar o catálogo e a campanha do próximo verão: duas fotógrafas, um videomaker, um ilustrador e uma modelo. Eles farão um making of de todo o processo de lançamento da coleção sob a direção conceitual de Alexandre Herchcovitch e direção de arte de Rogerio Hideki. Mas Testino continua por aqui. E foi o centro de uma grande festa segunda-feira que teve Gisele Bündchen se divertindo entre modelos e modernos. A noite era fechadíssima e a única câmera em ação era a do próprio.

Lilian Pacce para O Estado de S.Paulo (colaborou Emanuela Carvalho)

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