Ronaldo Fraga se lembra da primeira vez que foi para Brasília. Ele desembarcou na cidade e ficou a admirá-la ali mesmo, no aeroporto, olhando para os azulejos de Athos Bulcão. Vinte anos depois, o estilista apresenta sua coleção de outono-inverno 2011 e são daqueles mesmos azulejos que sai a sua nova moda. E foi assim: feita de vestidos estampados com os desenhos do multiartista brasileiro, que seguiram para o grupo de bordadeiras de Passira (PE) para o acabamento (que, o estilista conta, foi feito de acordo com a vontade estética delas, assim como fazia o artista, que deixava a cargo dos pedreiros a disposição de seus azulejos nos projetos arquitetônicos dos quais fazia parte). Feita também de camadas duplas de tule bordadas com traços de desenhos livres, sobrepondo uma peça ou outra coberta por paetês prateados; de jacquards, usados do lado direito e avesso, mostrando a força da cartela de cores em suas versões posistivo e negativo; e de estampas digitais recortadas a laser com o rosto da atriz Dina Sfat, que o estilista encontrou em fotomontagens menos conhecidas do artista. Com isso, há um avanço na linguagem, que sai do romântico e figurativo e flerta tanto com o abstrato quanto com o concreto. E há um avanço na forma, que continua afastada do corpo em cortes amplos e retos, mas desta vez toma forma quando no corpo. Quando se menos espera, entra na passarela a sequência final, de tafetás estampados com traços tremidos e tons esmaecidos, fazendo referência ao momento em que Bulcão sofria de Parkinson. “Ele não queria perder o movimento mas eu acho que, no fundo, ele não queria mesmo era perder a memória”, disse Ronaldo Fraga no backstage. Pelo que se viu em seu desfile, esse é um risco que o estilista não corre, uma vez que a nova coleção tem tudo para ficar na lembrança como uma de suas melh ores. (Antonia Petta)
