Fernando Cozendey primavera-verão 2014/15

07.06.2014

Depois de uma coleção divertida e marcante de outono-inverno 2014 com seus felinos, Fernando Cozendey faz mais uma reviravolta: as peças agora são todas em tons de azul com estampa jeans e branco, citando os tecidos que o Brasil mais usa (malha e jeans), só que absolutamente tudo em lycra – às vezes dublada, pra dar um caimento mais bonito. Elementos que antes tinham efeito trompe l’oeil na sua moda como os laços e os bolsos agora são “de verdade”, e pela 1ª vez aparece uma linha masculina na passarela. A brincadeira das mangas presunto, dos babados e do fraque ao lado da peça cheia de vazados na lateral e da calça de cintura baixíssima tem a ver com a inspiração rococó-funk, elite-periferia, embate entre Zona Sul e morro.

Está sacando o subtexto?

Talvez você já tenha ouvido (ou mesmo reproduza o discurso) de que não existe mais a luta de classes. Talvez você também seja do tipo que reclama por causa de greve e manifestação, que gera recordes de engarrafamento enquanto você volta pra casa no conforto do ar aquecido do seu carro. A trilha sonora do desfile é repleta de funks que – Fernando explicava no backstage – podem ser entendidos como veículos de expressão de gente que é reprimida de tantas maneiras, que canta o que vive, que se defende do jeito que dá. “Acho importante falar sobre isso. Fazer uma coleção divertida pra alguém comprar? Mas ninguém tá comprando nada, mesmo. Então achei que precisava ao menos passar uma mensagem no desfile, não consigo imaginar fazer outra coisa nesse momento”, o estilista conta.

Talvez o que você não entenda é que a questão não é se vai ter Copa ou não – porque a verdade é que vai. Mas a “Copa das Copas” radiante e feliz está longe de acontecer pra uma (enorme) parte da população que ainda não tem direitos essenciais como educação e moradia. Tem quem, antes do circo, está correndo atrás do pão. E a madame aparece empertigada no desenho do maiô gola alta ou do asa delta, fingindo que não vê. O mais interessante: no lugar da armadilha de um protesto elitista (como foi o caso de algumas marcas pontuais nessa temporada), Fernando opta por jogar luz na roupa da periferia e a traz pra passarela – o protesto também é estético e “fala” por si só, colado na pele. Por isso, fica infinitamente mais poderoso e provocador. (Jorge Wakabara)

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